Preservação do Hospital Matarazzo ainda sem definição

Grupo francês aguarda revisão de tombamento pelo Condephaat para iniciar a construção de um complexo comercial que inclui dois hotéis de luxo e um centro cultural nas antigas instalações do hospital localizado na Avenida Paulista, apesar dos protestos dos moradores da região

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O reaproveitamento das instalações do antigo Hospital Matarazzo (Hospital Umberto Primo), localizado na Bela Vista, foi tema da audiência pública realizada pela Comissão de Meio Ambiente da Câmara Municipal, presidida pelo vereador Aurélio Nomura.  A ocupação do espaço tem gerado uma grande controvérsia, pois o imóvel é tombado desde 1986 pelo Condephaat. Em 2011, o grupo francês Allard comprou o imóvel por R$ 117 milhões e pretende construir ali, entre outros, dois hotéis de luxo e um centro cultural, com investimento total de R$ 1 bilhão.  Os planos, no entanto, vêm esbarrando na resolução desse tombamento determinado há 47 anos.

O complexo hospitalar, construído em 1904, contava com casa de saúde, maternidade, capela e consultórios, e foi referência em saúde pelo pioneirismo em tratamentos e pesquisas. Graças à beleza das linhas arquitetônicas tornou-se um símbolo da cidade, o que levou ao tombamento como patrimônio histórico. Em 1996, a Caixa de Previdência dos Funcionários do Banco do Brasil (Previ) adquiriu o imóvel para a instalação de hotel e conjuntos médicos. O projeto, porém, nunca saiu do papel e o prédio ficou fechado por 17 anos, deteriorando ainda mais sua estrutura. Em 2010 foi adquirido pela Pontifícia Universidade Católica (PUC) , que tinha planos de instalar ali um novo campus, além de conjuntos comerciais, mas também não evoluiu.

De acordo com o presidente do Grupo Allard, Eduardo Ferreira Machado, a empresa fez um projeto novo para a área e conseguiu um acordo com o Ministério Público, por meio da assinatura de um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC). “Isso extinguiu a ação civil pública que estava sendo movida pela sociedade civil. Pelo TAC que assinamos, a capela e a maternidade serão integralmente preservadas e outros conjuntos tombados só na fachada, serão reformados internamente”, afirmou Machado.

Valéria Rossi, vice-presidente do Condephaat, órgão que também realizou uma audiência pública dia 07/10 para revisão do tombamento, mostrou-se favorável ao empreendimento, pois considerou que o projeto da Allard é “factível e que a decisão do MP pode construir um caminho para viabilizar o uso daquela área. As propostas surgidas na audiência que realizamos serão levadas aos conselheiros que poderão emitir um novo parecer sobre o tombamento”, disse Valéria. Da mesma forma, os vereadores Andrea Matarazzo (PSDB), que nasceu naquele hospital e Marco Aurélio Cunha (PSD), que fez residência médica no Hospital Matarazzo, também se mostram a favor da obra, citando a dificuldade financeira do Estado em adquirir imóveis históricos e a incapacidade em gerir os bens tombados.

Exemplo a não ser seguido
“A nossa principal preocupação é que sejam respeitadas as determinações do tombamento”, observou Célia Marcondes, presidente da Sociedade dos Amigos e Moradores do Bairro de Cerqueira César (Samorcc), na audiência pública realizada pela comissão de Meio Ambiente. “As entidades representativas não foram chamadas para elaboração do acordo para a assinatura do TAC. Foram convidadas duas associações, não regulamentadas, e dirigidas por uma única pessoa. É preciso que o proprietário faça reparos rápidos para que o bem não seja destruído e se perca um monumento importante para a história de São Paulo”, disse Célia.

Na oportunidade, a Samorcc requereu a apresentação do projeto completo da Allard (subsolo, solo e aéreo) com especificação de todas as instalações e ocupações, bem como o estudo de impacto ambiental “para que sejam respeitados os princípios constitucionais da transparência e celeridade”, destacou a presidente da Samorcc.

Para o advogado Antonio Fernando Pinheiro Pedro, especializado em questões ambientais, o TAC pôs fim ao conflito jurídico e extinguiu a ação pública, mas não acabou com o problema em si, pois o projeto não atende às exigências estabelecidas no processo de tombamento de 1986 e que está em vigor.

O vereador Aurélio Nomura, presidente da Comissão, lembrou, além disso, que um empreendimento nos mesmos moldes, o shopping que está sendo construído no terreno da antiga mansão Matarazzo, na Avenida Paulista, a poucas quadras do Hospital Matarazzo, teve sua abertura proibida por liminar conseguida pela Promotoria de Habitação e Urbanismo. A Justiça acolheu parcialmente uma ação civil pública proposta pelo Ministério Público (MP) e determinou que a Construtora Cyrela faça um relatório de impacto de vizinhança e de tráfego, e execute obras para amenizar os efeitos no entorno do empreendimento, previsto para ser inaugurado em novembro de 2014. A decisão judicial também proíbe a Prefeitura de São Paulo de emitir a licença de funcionamento ao shopping antes da conclusão das obras mitigadoras. De acordo com a decisão,os projetos provocam “inequívoco impacto no trânsito e infraestrutura urbana local, enquadrando-se como empreendimento gerador de impacto de vizinhança”.

Ao final da audiência pública, o vereador Aurélio Nomura observou, ainda, que nem sempre o TAC é seguido e citou o caso da Casa de Torrefação de Café, na Lapa (que vem sendo acompanhado pelo seu Gabinete) adquirido pelo Grupo Sonda, e que teve a chaminé e parte interna destruídas, desrespeitando o processo de tombamento.

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